
Martin Vedusa é um recente leitor desta casa, e deixou no meu último post, um excelente comentário que partilho convosco.
Li com atenção o seu pequeno texto a que chamou "quando fechamos uma porta...", e desde logo senti interiormente a necessidade de o comentar, porquanto a temática abordada no mesmo é de uma pertinência incalculável, para todos nós, viajantes cósmicos que procuramos o recentramento com a harmonia pré-estabelecida dos corpos celestes, ou seja, com o princípio emanador primevo: o Cosmos.
De facto, como a Magda bem sublinha, no árduo caminho da consciencialização espiritual das nossas falhas maiores, perdemos muito tempo divergindo da voz do sentido verdadeiro e interior a qual nos indica, graciosamente, o caminho correcto para a cura e a mudança interior. Esse tempo, ocupado em fuga ou dormência auto-sugerida, é irrecuperável e com ele se esfumam oportunidades de mudança, de acção, de consciência.
Ouvir a voz é, como bem notou, apenas o início do caminho; o Ser, é o haver-ser, isto é, o ter que ser, o transformarmo-nos em acção e consciência na aquilo que, indiscutivelmente, somos: chispas bem-aventuradas do AMOR eterno da pura graça existencial.
Este caminho de purificação, de cura e de ganho de consciência, implica acção concertada e direccionada, implica a destruição de modos equivocados de relação connosco próprios, com os demais e com a realidade. Implica, acima de tudo, enfrentarmo-nos de forma positiva ante o grande momento da vida: a nossa própria morte.
Na longa e sinuosa senda da vida, continuamos, procurando o sentido perdido de havermos sido, outrora, em completa harmonia vibracional com o grande corpo cósmico da criação.
Por ora, encontramo-nos vertidos neste mundo material, dependendo do uso da matéria, deslocados e descentrados na direcção de um futuro que nunca chega, orientados por preocupações que se formalizam em tarefas, coisas a tratar, que nos direccionam a sentimentos de ira, despeito, inveja, que nos invadem e sufocam o coração ---> vindos de dentro em projecção, e de fora, em estrita observância da inocente ou soberba ignorância alheia...
Inelutavelmente circunscritos à verdade do sofrimento nos encontramos.... Esta é uma das 4 nobres verdades de BUDA.
A verdade inexorável da morte obriga-nos a compreender a fragilidade da nossa condição encarnada, da nossa humana condição .
A transitoriedade de sermos-no-mundo, da finitude formal que nos é imanente, do nosso sentido ser o da relação e da interdependência, espelham, objectivamente, que o nosso sentido interior é referente ao outro, ao ABSOLUTO OUTRO que temos por tarefa principal conhecer!
O corpo enquanto acontecimento transitório, na sua materialidade, é extensão, é um exterior relativo ao espaço e ao tempo.
Enquanto seres, somos o INTERIOR desse exterior, e esse interior ambiciona o ABSOLUTO, a plenitude, a quietude e a paz: LUZ.
O mistério do ser da vida se actualizar e desvelar no decorrer do trilho para a própria morte, é incompreensível à mente racional, só o silêncio interior e a graça do AMOR presente nos nossos corações, poderão alguma vez nos guiar ao vislumbre do centro emanador da Graça Existencial que nos pertence.
Esta graça, sim, é a nossa única pertença, a nossa única e verdadeira posse, tudo o mais é ilusão!
É aqui e agora que podemos conquistar o desconhecido, é aqui e agora que temos o dever de aprender a DAR, é aqui e agora que o sofrimento é edificante!
A vida é a partida para descoberta de Si no OUTRO de NÓS MESMOS!
Somos PURO desejo de INFINITO!
Ousar ver o mistério é o grande desafio, verdade sentida e ígnea que simultaneamente nos aterra e deslumbra!
NO FIM ESTÁ O PRINCÍPIO!
“nisi credideritis non intelligetis” = se não acreditardes não compreendereis
Santo Agostinho, in “Confissões”
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Bem Haja;
Martim Vedusa